“A Ortodoxia manifesta-se, não dá prova de si”

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terça-feira, 3 de junho de 2008

"A Oração do Gêtsamani"

A oração de Cristo no Gêtsemani é, sem dúvida alguma, a mais elevada de todas as orações pelo seu valor e sua força redentora por todo o mundo. Ao mesmo tempo, ela é uma das revelações mais preciosas acerca de Deus e acerca do homem. Oferecida a Deus Pai no espírito do amor divino, eternamente presente na existência do mundo, ela age como uma luz que jamais diminui. Enquanto acontecimento histórico, ela não durou muito tempo; enquanto que ato espiritual do amor divino, começou desde antes da criação do mundo (ver I Pe. 1, 20), e não cessou de agir até este dia presente. Provamos a presença de sua força quando oramos pelo mundo inteiro e, sobretudo, no momento da celebração litúrgica. Sua santidade e sua grandeza atraem o coração daqueles que em si guardaram a imagem do Deus Vivo.

Nesta oração, o Senhor abraçou tudo o que se desenvolveu desde a criação do primeiro Adão até o último homem a nascer de uma mulher. É assim que temos aprendido a pensar em nossa Igreja (ver Jo. 1, 29: I Jo. 2, 2). Privados da experiência existencial de tal amor, nos é impossível conceber esta energia infinita que ilumina desde os séculos todo homem sedento por acolher este dom. “O céu e a terra passarão”, mas a obra realizada por Cristo (ver Jo. 17, 4) “não passará” (ver Mt. 24, 35). Esta oração se insere no incessante louvor celeste com seu conteúdo essencial. Ela não deixa de cumular nossa alma, de engendrar em nós o desejo de lhe corresponder com um mesmo amor total, “até o fim”, no presente século e no século que há de vir.

Em seu estado de queda, o mundo inteiro está em processo com Deus, acusando-O de Seus próprios sofrimentos. Em sua enfermidade – conseqüência do abandono do amor divino – o mundo acusa Deus com paixão. Eu isto conheço por experiência própria. Todavia, no Gêtsemani e no Gólgota, Jesus que é o Deus sem princípio, “justificou” o Deus-Criador. Lá, o “Homem-Cristo Jesus” (I Tm. 2, 5) também justificou o homem-humanidade diante do tribunal de Deus-Pai.

Do ponto de vista dos homens: se Deus é tal como Cristo O revelou; que Lhe convenha então a glória, honra e adoração por todos os séculos. Do ponto de vista de Deus Pai: se o homem é tal como o Cristo era: que o Pai então O acolha como o Seu igual, que Ele Lhe dê o trono “à Sua direita nos Céus”, acima de todo Principado, Poder e Domínio, e de todo outro nome que poderá ser nomeado não somente neste século, mas ainda no vindouro (ver Ef. 1, 20-21).

Vitorioso na eternidade, o amor de Cristo é submetido – sobre o plano terrestre – a provações extremamente penosas. Ninguém nunca sofreu tanto como Ele. A profundidade do sofrimento está diretamente relacionada com o nível de sensibilidade de cada um. Entre os homens, existem tantas diferenças como entre um rinoceronte e um verme: esmurre violentamente o primeiro e ele não sentirá; basta somente tocar o verme que ele começa a se contorcer em virtude da dor. O ouvido afinado do músico é dolorosamente incomodado por uma dissonância imperceptível aos outros; o olho do pintor remarca diferença de tons nas cores, lá onde outros – apesar de todas as explicações que poderíamos dar – continuam a não verem nada. O homem espiritualmente sensível percebe o estado moral daquele que ele encontra enquanto que a maioria das pessoas nada (re/pres) sentem.

O mesmo é válido para os homens, quem poderá então compreender o Cristo, Criador do Universo? “E viu Deus tudo quanto tinha feito, e eis que era muito bom” (Gn. 1, 31). O Criador da harmonia divina não podia deixar de Se afligir ao encontrar por toda parte deformações intoleráveis trazidas à beleza original do mundo pelos atos degradantes e criminosos dos homens. Nós o sabemos todos: mais nós amamos profundamente, mais ressentimos dolorosamente o menor dos conflitos. O que Ele, o Amor Eterno, provou quando os homens repeliram com tanta raiva o testemunho que Ele dava do Pai? Ele que a Igreja chama de Sol de Justiça foi entregue no julgamento iníquo daqueles que O condenaram à morte. Ele, a Verdade hipostática, foi caluniado, desonrado, cruelmente batido: cuspiram-No insolentemente, Ele que estava sem pecado (ver Jo. 8, 46), Ele tomou sobre Si os pecados do mundo, como se Ele próprio fosse o culpado desta tragédia. “Aquele que nos amou até o fim” (Jo. 13,1), suportou as perseguições causadas pela raiva insaciável daqueles que O mataram, “cuidando fazer assim um serviço a Deus” (Jo. 16, 2).

A fim de poder, mesmo que seja um pouco, aproximar nossa consciência da compreensão daquilo que se passou naqueles dias – os mais trágicos em toda a história do mundo – a fim de poder contemplar de uma maneira existencial, mesmo que seja “por espelho, em enigma” (I Co. 13, 12), o caminho percorrido por Cristo, devemos todos passar por inumeráveis provações. Quando se abatem sobre nós todas as espécies de golpes e de males, voltamos então nosso espírito à contemplação dos tormentos de todos aqueles que sofrem sobre a Terra; os incluímos – pelas nossas próprias dores – na oração de nosso coração. Nosso coração alargar-se-á, desta maneira, e abraçará todos os irmãos e todas as irmãs esmagados por tantos desastres, tal como uma mãe abraça seus filhos doentes no impulso dum amor doloroso.

Que a nossa oração se torne o clamor da terra inteira a Deus, nosso Pai! Tal oração, pela ação do Espírito Santo nos torna participantes da paixão redentora do amor divino do Senhor. Ninguém dentre nós chega à imensidão do Seu amor, todavia, é já algo de grande, que a Sua vida se revele a nós, mesmo que seja parcialmente, mas numa certeza irrecusável. “Tornados conformes (espiritualmente) à Sua morte”, nós somos julgados dignos de conhecer o Cristo de uma maneira existencial (ver Jo. 17, 3) assim como a “virtude da Sua Ressurreição” “(Fp. 3, 10). “Porque se formos plantados juntamente com Ele na semelhança da Sua morte, também o seremos da Sua Ressurreição” (Rm. 6,5). Pelos choques que se nos abatem, nossa natureza – tornada insensível pelo pecado – nasce novamente à uma oração que reflete, em certa medida, a oração do Gêtsemani. Antes de atingir a idade madura, nos é dado geralmente de experimentarmos mortes parciais, nós nos tornamos, na medida desta experiência, ainda mais capazes de contemplar o Cristo dirigindo-Se ao Jardim do Gêtsemani, e em seguida ao Gólgota.

As dores físicas de Cristo – suportadas durante a crucifixão sobre a Cruz ou durante a flagelação – não ocupam a parte primordial, mas antes tornam completos os Seus sofrimentos sobre todos os planos. Até nós, bem o sabemos que a alma pode, em sua própria esfera, receber feridas mais dolorosas do que o corpo. Se tal é o caso da alma em sua condição terrestre, o que quer dizer então da alma – espírito que acolhe a eternidade? “Quanto maior é o amor, maior é o sofrimento da alma. Quanto mais profundo é o amor, mais imensa é a dor” (ver Starets Siluan). E qual homem ousaria dizer que o seu amor ultrapassa aquele de Cristo? Nós apenas sonhamos aqui nesta esfera do Ser, à qual atingimos unicamente pelo poder do amor espiritual dado do Alto.

É impossível desenhar uma imagem dos sofrimentos de Jesus Nazareno. Toda a Sua vida conosco não passou de um tormento incessante. O Gólgota não passa de um ato final, no qual tudo se uniu, como que em um ponto culminante: dores físicas, aflições da alma e em seguida à recusa dos homens em acolher a Boa-Nova do amor do Pai, morte infame como aquela de um malfeitor, riso cínico daqueles que se vingavam por terem sido acusados de injustiça... Todos O condenaram: o Estado Romano com o seu direito, a Igreja da Antiga Aliança, fundada sobre a revelação do Sinai. Mesmo até o povo que havia recebido d´Ele tantos benefícios, exclamava: “Crucificai-O”. Adicionemos a tudo isto a fuga dos Discípulos, a traição de Judas, o renegar de Pedro, o abandono de Deus – “Meu Deus, Meu Deus, por que Me abandonaste?” – a descida ao inferno daqueles que cumulavam este lugar tenebroso. O inferno de Cristo, é claro, não poderia ser o inferno da raiva; mas antes o contrário, o inferno mais doloroso, aquele do amor. Era necessário adicionar ainda muitas outras coisas, as quais o nosso espírito não pode compreender, pois que não conhece o amor devido a Deus e ao próximo.

O Senhor não orou até suar de sangue pelos Seus próprios pecados, mas antes em virtude de nossa perdição. Isto sobressai claramente de Suas palavras às mulheres que choravam sobre Ele: “Não choreis por Mim; chorai antes, por vós mesmas e por vossos filhos” (Lc. 23, 28). Todavia, era também necessário que o Cristo – em Sua humanidade – passasse pela provação da kenosis total, tal como já havia se realizado nos Céus – segundo a Sua divindade – em relação ao Pai. É enquanto homem que Ele orou a propósito do “cálice”. Ele nos revelou o caráter do Deus amor. A perfeição consiste no fato de que este amor é humilde, o que quer dizer que ele se dá sem reserva. O Pai Se esvazia completamente na geração do Filho. Quanto ao Filho, Ele rende tudo ao Pai. É precisamente este ato de kenosis total que o Senhor realiza em Sua Encarnação, no Gêtsemani e no Gólgota. É precisamente este amor que Cristo ordena: “Se alguém vier a Mim e não aborrecer o seu pai, e mãe, e mulher e filhos, e irmãos e irmãs, ainda também a sua própria vida (alma), não pode ser Meu discípulo” (Lc. 14, 26), ele “não é digno de Mim” (Mt. 10, 38). Assim, somente aquele que – no movimento de todo o seu amor, à semelhança dos mártires – perder a sua vida neste mundo por causa o Cristo, “entrará no próprio céu, a fim de aparecer” diante da Face de Deus para “uma vida que não perece” (ver Hb. 9, 24; 7, 16).

O sentido do sacrifício de Abraão é o seguinte: em sua velhice, Abraão havia se ligado a Isaac, o “filho da promessa”, a tal ponto que o seu amor por Deus havia perdido sua plenitude. A fim de que o amor por Deus torne-se de novo a “pedra angular” de sua vida, Abraão deve oferecer um sacrifício: imolar seu filho bem-amado. Quando este ato é realizado interiormente, a morte de Isaac torna-se inútil: ele podia permanecer junto de seu pai.

Fatos semelhantes se repetem na vida do cristão. Quando uma ou outra paixão o separa de Deus, ele deve estar pronto a muitos sacrifícios. E se o ato interior do sacrifício é realizado com perfeição, as paixões se retiram e a “imolação” torna-se inútil.

A situação de Cristo era diferente. Interiormente, o Senhor realizou Seu sacrifício no Gêtsemani. Mas, em vista da “obra” (Jo. 17, 4), era necessário que Ele sofra “até o fim”, mesmo exteriormente; senão ninguém poderia ter compreendido o mistério da redenção. Eis porque, no Gólgota – e não no Gêtsemani- que Cristo exclama: “Tudo está realizado”.

Na pessoa do primeiro Adão, a humanidade sofreu uma terrível alienação, que iria principiar todas as seguintes. A queda do nosso Antepassado constituiu uma catástrofe de dimensão cósmica. É indispensável tomar conta disto, para compreender o processo orgânico (para não dizer lógico) da evolução que se manifesta em formas políticas, mas que é, na realidade, espiritual: “De morte morrereis” (Gn. 2, 17) pelo fogo já preparado a tudo devorar. As gerações seguintes adicionaram quantidade de outras doenças àquelas de Adão, de sorte que o corpo inteiro da humanidade está “desde a planta do pé até a cabeça, coberto de feridas e inchaços, e chagas podres não espremidas” (Is. 1, 6). O esqueleto, ele próprio, está fraturado por toda parte. Tocar um organismo que se encontra em semelhante estado significa lhe fazer provar dores insuportáveis. Quando trata-se de doenças físicas, nos dirigimos habitualmente, com confiança as mãos dos médicos, e esperamos com paciência sua ajuda. No plano espiritual, observamos o fenômeno inverso: toda tentativa de recolocar os ossos em suas posições corretas, de lavar as feridas – realizados inevitavelmente acompanhado de dores – é acolhido com hostilidade, como se o médico fosse a causa das dores.

Eis o quê se passa com Cristo: Ele, o único verdadeiro “Médico” capaz de curar, afligiu todos os homens, pois fez ver a toda humanidade a sua doença mortal. Para os filhos caídos da humanidade, nada nem ninguém é mais terrível do que o Cristo – Verdade. O mundo inteiro O teme. Quão numerosos aqueles que, animados por uma raiva inexplicável, lançam sobre Ele – e somente sobre Ele – todas as sortes de censuras e infâmias. Quanto àqueles que O acolhem verdadeiramente como Verdade primária, em virtude da atração espontânea dos homens pela Verdade – eles não podem recusar de segui-Lo. Isto significa tornar-se portador de Seu amor e logo, inevitavelmente, ser crucificado de diversas maneiras.

A revelação – mesmo parcial – da vida interior de Cristo tem um valor inestimável para nós. Por meio de uma longa ascese, penetramos pouco a pouco o sentido eterno e o caráter especial de Seus sofrimentos. Compreendemos que eles ultrapassam – não somente qualitativamente, como também por seu poder – tudo o quê o mundo conhece. Não atingiremos de maneira alguma a primazia eterna sobre todos os planos. Apesar disso, devemos, enquanto crentes, aspirar a conhecê-Lo da maneira mais completa possível. É na medida em que nós conhecemos os Seus sofrimentos redentores que a Sua glória repousará sobre nós também: “E Eu dei-lhes a glória que a Mim Me deste” (Jo. 17, 22). Por Ele, nos tornamos filhos do Pai sem princípio. Nós sabemos agora que “ninguém vai ao Pai senão por Ele” (ver Jo 14, 6). Nós acolhemos estas palavras de Cristo em seu senso absoluto. Em efeito, se não houvesse desde a origem o princípio da paternidade e da filiação no seio da divindade, nenhuma ascese humana poderia chegar a mudar substancialmente o próprio Ser primário.

Cristo é um prodígio que ultrapassa toda inteligência. Ele é a mais perfeita revelação do Deus de amor tri-hipostático; Ele nos revelou o homem em suas possibilidades ilimitadas. A um dado momento, conhecido de Deus somente, seremos conduzidos à fronteira invisível que se encontra entre o tempo e a eternidade que nos espera: seja estar com o Cristo em Sua semelhança, seja estar separado, longe d´Ele. Depois desta escolha – livre e decisiva – a semelhança tanto quanto a dessemelhança tomarão um caráter atemporal (eterno). Preparando-nos em nossa vida cotidiana para tal acontecimento, duma importância capital para cada um de nós, iremos mais de uma vez hesitar: cumprir os Mandamentos ou agir segundo as nossas paixões?

Nesta ascese que dura toda a nossa vida, o mistério de Cristo se nos revelará progressivamente, contanto que, por amor por Ele, façamos de Sua palavra a única Lei de nossa existência. O momento virá em que a visão da santidade do humilde Cristo-Deus consumirá o nosso ser tal como um fogo, transformando-o completamente num impulso de amor. Desgostados de nós próprios em virtude do mal que se esconde em nós, seremos repletos do desejo de nos assemelharmos ao Cristo em Sua humildade. Este desejo manifestar-se-á como uma sede mortal. As primícias da santidade já se encontram neste lancinante desejo de lá chegar. Quando ele aumenta, eis que então o nosso amor pelo Senhor nos torna de uma maneira natural mais próximos d´Ele, nos movimentos profundos do coração e nas intuições do intelecto. Uma visão se abre diante de nós, que ultrapassa toda imaginação. Uma imensa tristeza pelo sofrimento dos homens oprime o nosso coração como que em espasmos dolorosos. Esquecemos o nosso corpo; somente o nosso espírito – na medida em que ele está acessível – entra na corrente da oração do Cristo no Gêtsemani. Assim, nasce em nós o conhecimento do Senhor Jesus (Jo. 17, 3), que é a vida eterna. Para adquirir tal conhecimento, o Apóstolo Paulo considerou “como uma perda [...] todas estas coisas” (a justiça e a Lei). Ele “renunciou a tudo, [...] a fim de ganhar o Cristo [...] e o poder da Sua Ressurreição, e a comunhão aos Seus sofrimentos, se tornando-lhe conforme na morte, a fim de alcançar a Ressurreição”. Paulo falou desta maneira, não porque “já havia alcançado o alvo, [...] mas esquecendo-se das coisas que atrás ficam e avançando para as que estão adiante, [...] pelo prêmio da soberana vocação de Deus em Cristo Jesus” (Fp. 3, 7-14).

O grande Apóstolo Paulo dizia que ele “não tinha ainda chegado ao alvo”. Como, então, ousaríamos pretender nos igualar a Cristo? Todavia, certo paralelo deve existir. É absolutamente indispensável que exista uma semelhança – mesmo que ela seja pálida – entre o Senhor e nós, para poder trazer com razão o nome de cristãos. Mais uma vez: aspirando a honra, Paulo chamava os Coríntios a imitarem-no (I Co. 4, 16), tal como ele próprio imitava o Cristo. É isto o quê fazemos neste presente, para tornarmos-nos co-herdeiros de Jesus na glória incorruptível (ver Rom. 8, 17).

Eu me esforço – apesar de minha incapacidade – em falar desta ciência, a mais grandiosa de todas aquelas que a Terra e o céu conhecem. Ela se assimila não por meio de alguns breves anos de estudos acadêmicos, mas por todo o nosso ser. O conhecimento real, existencial, não abstrato, se adquire pela participação no ser, por meio de um arrependimento ardente e a guarda no espírito dos Mandamentos, que esta benção temível nos é dada.

Quando certa sombra de semelhança com a oração do Gêtsemani o cobre, o homem destrói (quebra) as cadeias do individualismo egoísta e entra num novo modo de existência: uma existência pessoal, hipostática, à imagem da Hipóstase do Filho Único. Acolher o amor sofredor do Cristo é um dom inestimável do Espírito Santo; por meio de tal dom, o homem se aproxima espiritualmente da percepção da morte do Cristo sobre a Cruz e, ao mesmo tempo, do poder da Sua Ressurreição. Aquele que, numa oração profunda pelo mundo e numa sede inextinguível de salvação dos homens, se une ao Cristo, por uma semelhança à Sua morte, antecipada também é a semelhança à Sua Ressurreição (ver Rm. 6,5 ; 8, 11). Guiado por uma força que desce do alto neste novo modo de ser, ele atinge “o fim dos séculos” e toca de maneira sensível a eternidade divina

A Hipóstase-Pessoa é o princípio primário e a dimensão final, última, universal, no Ser Divino; o mesmo acontece para com o ser humano criado à imagem de Deus. Nada existe e nem pode existir fora deste princípio hipostático: “Todas as coisas foram feitas por Ele, e sem Ele nada do que foi feito se fez. Nele estava a vida”. (Jo. 1, 3-4). “Vivo eu, diz o Senhor” (Is. 49, 18); “Eu sou [...] o Princípio e o Fim, o Primeiro e o Derradeiro” (Ap. 22, 13); “Eu sou” (Jo. 8, 58).

Os dons de Deus são indescritíveis: eles fazem do homem portador da plenitude do ser divino-humano, pela união com o Cristo na oração que o torna semelhante a Ele. Um privilégio raro, que une os estados extremos do sofrimento, do amor e da vitória deste mesmo amor. Depois de tal experiência, através duma dor vivificante, o homem penetra lentamente numa percepção ativa da Ressurreição de sua própria alma. Ele vê claramente que o “Cristo ressuscitado dentre os mortos já não morre; a morte não mais terá domínio sobre ele” (ver Rm. 6, 9). A vitória na eternidade é certa. O espírito ora em nós:

Meu Senhor e meu Deus... Agora, Senhor Jesus Cristo, pelo dom do Teu insondável poder e pela Tua benevolência para conosco, eu também, ainda que pobre e miserável, passo da morte à vida... Agora – eu sou.

Pelo Arquimandrita Sofrônio de Maldon – Essex
Texto extraído do livro “Voir Dieu tel qu´Il est”
Les éditions du Cerf – le sel de la terre, 2004
Tradução: Manastir Sv. Apostola Petra i Pavla, BiH.
Boletim Interparoquial, Abril-Maio de 2008