“A Ortodoxia manifesta-se, não dá prova de si”

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terça-feira, 23 de outubro de 2007

"O que sabe a Alma"

"A Ortodoxia manifesta-se, não dá prova de si"

O padre intelectual Fr. Pavel Florensky, que pereceu num campo de trabalhos forçados soviético escreveu o comentário acima sobre a nossa fé. Ele quis dizer que aprender a religião Cristã Ortodoxa é uma questão do coração descoberto na alma daquele que procura. Não é encontrada na mente apenas. A pessoa não chega a conhecer Deus; a pessoa O experimenta. Quem insiste numa explicação racional da fé em Deus muito provavelmente partirá com seu ateísmo e ceticismo renovados.

Um tratado clássico sobre a espiritualidade, “O Sagrado” (Das Heilig), de Rudolf Otto, começa com um chamado ao leitor para que recorde uma experiência de sua vida que transcenda tudo aquilo que pudesse explicá-la. A avassaladora sensação luminosa, ele assim a designou. Otto insistia em que: cada indivíduo possui (...) tal evento no baú de sua memória; entretanto, se o leitor for incapaz de relembrar um tal motivo de espanto transcendental, ele nada obterá do livro de Otto.

Certa feita, depois de Beethoven tocar uma de suas sonatas ao piano, uma mulher o perguntou: “Qual o significado disso?” O grande compositor ponderou a pergunta um largo instante. “O que significa?”, repetiu. Voltando ao seu banquinho ao piano, ele tocou a sonata toda de novo. “É isto o que significa”, gritou. Algumas experiências desafiam a explicação.

Aquele que chamamos, o Senhor, nos manda, no Evangelho lido em nosso Batismo: “Ide e pregai, ensinai e batizai”. A Ordem divina permanece um desafio para todos, e é, frequentemente, desdenhada. Nós a deixamos para os especialistas e evangelistas. Porém, é nossa preocupação compartilhar a fé; por não estarmos dentre o clero, ou dentre um dos teólogos, não quer dizer que estejamos dispensados da evangelização. De fato, as dificuldades são colossais, mas você pode sair-se bem dirigindo-se à pessoa que você quer conquistar para Cristo. É só você pensar que está se dirigindo à alma desse que você quer trazer para Cristo na Ortodoxia. Você vai dizer uma palavrinha sobre a Palavra se você sempre começar onde a outra pessoa está espiritualmente. O que ela sabe sobre a Bíblia? Quais são as partes dominantes, quais são as partes desconhecidas ou ignoradas? E, quanto você conhece a Bíblia? Você é capaz de explicar o modo pelo qual a Igreja captou, e até expandiu, a mensagem básica do Evangelho?

As características externas da Igreja Ortodoxa podem intrigar à pessoa que você está tentando conquistar para o Senhor. Os ícones podem fasciná-la, também os mosaicos, a adoração e a tradição – e você pode partir daí, desde que o interesse deles vá além do superficial. Tudo o que fazemos tem um significado mais profundo, e a finalidade dos nossos sons e gestos está em direcionar o fiel à uma cada vez mais profunda união entre si e a Santíssima Trindade. Muitos são como banhistas no litoral, que gostam da água, mas nunca entram nela porque podem se molhar. Temos visitantes, espectadores, que chapinham nas coisas Ortodoxas. A Iconografia está em voga hoje em dia. Existem verdadeiros experts, auto-proclamados que podem palestrar sobre as centenas de estilos da Theotokos, discernir, pela cor, entre um ícone de Novgorod e um de Moscow, mas jamais se dignariam a venerar qualquer um deles. A Ortodoxia não é para espectadores ou diletantes; ela é o caminho para ser um com o Pai, o Filho e o Espírito Santo.

Como está na citação de St. Fr. Florensky, acima, os ícones são mais que tinta e forma sobre a madeira. Eles honram àqueles escolhidos para serem retratados, àqueles que em suas vidas tornaram-se mais semelhantes a Deus, a quem ofereceram suas vidas e a quem entregaram suas vontades.
Rev. Vladimir Berzonsky